A maternidade ainda é uma barreira à ascensão de mulheres no trabalho, apesar do avanço do debate social sobre desigualdade de gênero e das ações afirmativas de empresas para corrigir distorções entre homens e mulheres em relação a remuneração e promoções.
Basta ver os últimos estudos sobre o tema. Lançado em setembro do ano passado, o Women in the Workplace 2021, da Leanin e McKinsey, mostra que entre 2016 e 2021 a participação das mulheres no C-level de empresas com matrizes nos Estados Unidos saiu de 19% para 24% dos cargos disponíveis, avanço que, apesar de bem-vindo, ainda reflete a desigualdade de um país desenvolvido, que tem 3,3 milhões mais mulheres do que homens e maior prevalência delas, também, no ensino superior.
Em relação à remuneração, a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílio (PNAD Contínua) mostrou que, no Brasil, no primeiro trimestre de 2022, as mulheres ganham 20,5% menos do que os homens, inclusive entre profissionais de mesma idade, cor, escolaridade e grupo ocupacional. A mesma pesquisa destacou, ainda, que a taxa de desemprego entre elas é quase cinco pontos percentuais maior do que a dos homens (13,9%, contra 9%), havendo também um claro avanço do desemprego em desfavor delas ao longo da pandemia.
A razão do menor acesso a postos de liderança e salários mais baixos tem origem em vários fatores, entre eles a visão preconceituosa e machista da maternidade, segundo a qual as mulheres se tornariam menos produtivas e comprometidas quando atingem a maternidade. Essa visão está na raiz do que chamamos de glass ceiling (teto de vidro), uma barreira não explícita a impedir que mesmo as profissionais mais produtivas, competentes e talentosas cheguem a postos da alta gestão.
À medida que as empresas passaram a enfrentar essa questão, no entanto, vem ficando cada vez mais evidente que a barreira às mulheres não ocorre só no nível anterior ao do alto escalão, mas muito antes disso. Há também o “degrau quebrado”, uma série de barreiras baseadas em crenças e vieses inconscientes, entre eles a suposta improdutividade e o descomprometimento de mulheres que são ou um dia podem ser mães, a impedir o acesso delas já à primeira posição de gestão.
O degrau quebrado fica bastante evidente quando o RH analisa dados como a prevalência de homens e mulheres em cada nível da organização, geralmente retendo as mulheres nos níveis iniciais e favorecendo o avanço dos homens. A concessão de oportunidades de desenvolvimento, promoções e salários também costuma favorecer mais os homens. O número de desligamentos até um ano depois da licença maternidade também é outro indicador importante, ao mostrar quão hostil a organização pode ser às mulheres.
A análise desses dados costuma oferecer KPIs para gestores de RH e de diversidade reduzirem disparidades, equalizarem o acesso a oportunidades e tornarem as empresas locais em que mulheres, especialmente as mães, sejam respeitadas, esperadas e se vejam refletidas em todos os níveis e em proporções similares à da demografia social.
Também oferece insights para que RHs e lideranças enfrentem decisões enviesadas que impedem mulheres de progredir, além de fazer as organizações verem a maternidade como parte do papel social, já que mulheres, muito além de produzir riqueza com seu trabalho, também formam as futuras gerações, inclusive de profissionais e consumidores.
Então, revise os KPIs, faça um planejamento de ações corretivas, como programas estruturados de mentorias ou de sponsorship para dar às mulheres oportunidade de desenvolvimento e visibilidade necessárias ao avanço na carreira. Também sensibilize a empresa para a desigualdade de gêneros, não só no Dia das Mulheres, mas o ano todo.
Mulheres, inclusive as mães, podem ser tão produtivas, comprometidas e bem-posicionadas em suas carreiras quanto os homens. Enfrentar o preconceito contra a maternidade só vai deixar esse fato cada vez mais evidente.
* Letícia Rodrigues é mãe do Carlinhos e do João Pedro, consultora em diversidade, equidade e inclusão, além de sócia-fundadora da consultoria Tree Diversidade.
Para aprender mais
Apenas 6% dos CEOs do mundo são mulheres. Algo está errado e precisa mudar. Mas como? O Carreira Mulher, série de aulas original e exclusiva do Administradores Premium, surgiu com o objetivo de ajudar a aumentar o número de mulheres em postos de liderança. Apresentado por Fabrícia Faé, Head de Coaching e Desenvolvimento de Talentos da Lee Hecht Harrison (LHH) Brasil para o Norte e Nordeste, o programa convida profissionais mulheres, gestores e empresas a desenvolverem juntos os hábitos e capacidades para a construção de um cultura mais inclusiva no mercado de trabalho.