Uma pesquisa recente da Tree Diversidade e do Grupo TopRH com 276 profissionais de DE&I (diversidade, equidade e inclusão) fez revelações preocupantes sobre o ambiente em que atuam as pessoas responsáveis por construir empresas mais diversas e inclusivas.
A mais grave é a aparente ausência em muitas delas de uma gestão corporativa que considere a diversidade como um elemento estratégico do negócio. Nessas empresas, há alta prevalência de profissionais de DE&I sem função específica na área (54%), líderes de DE&I que acumulam atribuições de outras áreas, realizam atividades fora do horário de trabalho, sem reconhecimento da chefia imediata, poderes práticos outorgados pela alta liderança ou orçamento adequado.
Muitos dos profissionais entrevistados contaram que, em suas empresas, há apenas comitês de diversidade ou identitários como estrutura de DE&I sem representantes da alta liderança. Em muitos dos casos, essas pessoas acabaram sendo recrutadas para atuar nesses comitês simplesmente por pertencerem a um determinado grupo minorizado, sem formação na área e novamente acumulando funções. Este é talvez o sinal mais preocupante de que num conjunto expressivo de empresas, a DE&I é tratada como uma espécie de voluntariado corporativo.
Claro que existem empresas com ações estruturadas e integradas à estratégia do negócio — e são muitas. Coincidentemente são também as empresas com as melhores habilidades de comunicação, acesso à imprensa e capacidade de criar no público geral a percepção de que o debate sobre diversidade estaria mais maduro do que a realidade examinada sob escrutínio nos faria crer.
Além da falta de lugar específico no organograma, os profissionais entrevistados relataram falta de comprometimento da alta liderança com temas de DE&I, a inexistência de políticas claras para viabilizar ações de inclusão e, pasme, falta diversidade na própria equipe responsável por tornar a empresa mais diversa e inclusiva.
Na amostra pesquisada, 75,7% dos gestores de DE&I são mulheres cisgêneros, prevalentemente heterossexuais, brancas e jovens. Os gestores autodeclarados pretos e pardos somados são 44,2%. Pessoas com deficiência, apenas 5,8%. Pessoas trans, não-binárie e de outras identidades de gênero registraram prevalência abaixo dos 3%.
Não é de se admirar que, neste cenário, muitos profissionais de DE&I (34,4%) verbalizassem uma piora significativa na própria saúde mental, além de dificuldades para dormir, de bem se alimentar, de lidar com as próprias equipes, do desconforto em discutir questões de assédio, frustrações e desvalorização com a empresa.
O estresse e o desgaste mental se acentuam ainda mais quando o escopo de trabalho faz com que desaguem nesses profissionais as queixas de racismo, machismo e preconceitos de toda sorte, antes não visíveis por não haver canais apropriados para encaminhá-las.
Fazer empresas diversas e inclusivas requer uma abordagem estratégica, com comprometimento de cima a baixo na organização. Ou a diversidade é parte da estratégia corporativa para além do discurso, ou ela simplesmente não se sustenta no tempo.
Fica aqui o convite à reflexão às lideranças das empresas já iniciadas na jornada da DE&I, para que olhem para dentro, entendam se possuem minimamente uma governança, profissionais capacitados e orçamento.
Sempre é tempo de corrigir rotas e mirar, efetivamente, a inclusão.
* Letícia Rodrigues é consultora especializada em diversidade, equidade e inclusão, além de sócia-fundadora da Tree Diversidade.