Por mais que as discussões sobre discriminação na sociedade venham crescendo, ainda temos muito para refletir sobre a identificação e ruptura dos estereótipos sociais, que dão origem a preconceitos e ações discriminatórias dentro do mercado de trabalho. Já está mais do que na hora de as lideranças das empresas entenderem que o rótulo social insere o ser humano em grupos que olham somente para o exterior de cada um, o que não define qual é a verdadeira qualificação de um profissional ou candidato a uma vaga de trabalho.
O rótulo ou estereótipo no mercado profissional pode ser cruel com todas as pessoas, mas é especialmente mais cruel com as mulheres, as pessoas pretas, aqueles que tem mais de 40 anos, quem é portador de necessidades especiais, entre outras minorias. Essas pessoas encontram inúmeras dificuldades tanto durante um recrutamento para uma vaga profissional como na ascensão profissional e financeira dentro das empresas. Pesquisas comprovam que mulheres e pessoas pretas ainda possuem salários menores e são minoria nas posições de lideranças nas companhias. Com isso, podemos constatar que, mais do que competência, ainda predomina um padrão estético e comportamental que julga com desigualdade e diferenciação na escolha dos indivíduos.
Conscientização e mudança
Além de implantações de ações públicas do governo e de leis — como a do Jovem Aprendiz, a de cotas PcD e o Programa Nacional de Imunizações (PNI) —, as empresas precisam se conscientizar e buscar ações que eliminem todo e qualquer preconceito em suas gestões. Lembrando que isso só será possível se, em primeiro lugar, os gestores admitirem que a discriminação existe.
O tema deve ser pauta dos assuntos internos e até de treinamentos e congressos, que o trabalhem em equipe, lembrando que a empatia e o respeito às individualidades reduzem conflitos e trazem leveza ao ambiente profissional. As pessoas que se sentem vítimas de algum tipo de discriminação dentro da companhia devem ter espaço aberto para expor a sua dificuldade e chegar a uma solução ou entendimento com todo o apoio da equipe de Recursos Humanos. Outros funcionários que presenciaram atitudes deste tipo em seus departamentos devem colaborar, intervindo ou levando a situação a líderes que possam solucionar o problema.
Empatia profissional
A discriminação não deve ser tolerada em ambiente de trabalho, e é preciso deixar claro que liberdade de expressão não dá carta branca para o preconceito. Pois respeito, solidariedade e empatia são valores fundamentais em ambientes corporativos. Portanto, atitudes de preconceito devem ser punidas com advertências, afastamentos ou respondendo à Justiça, dependendo do caso.
O preconceito, muitas vezes, está enraizado nas palavras e, por isso, as empresas devem levar ao conhecimento dos funcionários o Manual Prático de Linguagem Inclusiva — podendo até criar uma cartilha interna sobre o assunto. Há determinados tipos de piadas e palavras que são ofensivas e as pessoas precisam ter mais consciência sobre esse tipo de comportamento. A relação do trabalho deve ser pautada pelo respeito, lembrando que a diferença entre um profissional e o outro está apenas relacionada a eficiência, habilidade e competência, e isso independe da idade, da ascendência ou de qualquer outro fator do tipo.
Bons exemplos de inclusão
Algumas empresas buscam programas específicos de inclusão para os que possuem menos oportunidade e vivem uma situação de vulnerabilidade social. Há exemplos como o Programa de Trainee da Magalu, voltado 100% para pessoas negras, e eu mesma trabalhei num projeto da Seda para jovens entre 16 e 18 anos, cujo objetivo era fazê-las acreditar nas suas capacidades de realizar objetivos de vida em todas as áreas, incluindo profissional e financeira.
Já o departamento de Recursos Humanos deve se precaver contra qualquer tipo de rótulo e preconceito, lembrando que a diversidade favorece o ambiente profissional, pois gera troca de experiência. Na contratação de pessoas, é necessário não só checar suas habilidades, mas também levar em conta o histórico de vida e as dificuldades encontradas. Somente desta forma as oportunidades serão distribuídas em igualdade entre todos os candidatos. Há requisitos que podem ser exclusivos e, dependendo da vaga, podem ser flexibilizados, como por exemplo o inglês, no qual nem todos tiveram a oportunidade de se aprofundar em escolas públicas.
Mudando o cenário de preconceito
Ainda há inúmeras empresas com unanimidade branca ou onde a maioria ainda é homem. Está mais do que na hora dessas companhias repensarem esse sistema e começarem a fazer uma análise interna sobre questões como: quantas mulheres ou pessoas pretas estão na liderança? Quantos funcionários com mais de 40 anos fazem parte da equipe? Ou ainda se estão dando espaço para todos que, de alguma forma, sofrem preconceitos,
Já vemos em algumas emissoras de televisão e até em campanhas publicitárias maior diversidade de raça, de cor, de gênero e até de estilo e, aos poucos aquele padrão branco, magro e “perfeito” — muito visto nas passarelas da moda — vai dando lugar à realidade da dissemelhança. Que assim seja também no mercado de trabalho!
* Kelly Stak é consultora de RH, especialista em desenvolvimento de pessoas e escritora do livro “Rótulos Não Me Definem: Uma História de Resiliência”