Em entrevista ao site Neofeed em julho, o gestor do fundo Alaska Black, Henrique Bredda, fez várias considerações sobre como enxerga o processo de recuperação da Bolsa de Valores depois do tombo provocado pela crise da covid-19, que afetou duramente, inclusive, seu próprio fundo, que amargou duras perdas nos últimos meses. E um ponto específico destacado por ele merece atenção dos pequenos empreendedores. Ao explicar sua visão sobre o descolamento do PIB e da bolsa em alguns contextos, ele ressaltou que nessa fase de retomada as grandes empresas listadas na bolsa devem retomar a vida normal com mais facilidade, por terem mais caixa e crédito. Ao mesmo tempo, os pequenos devem enfrentar mais dificuldades, justamente por disporem de menos reservas e mais entraves a linhas de crédito.
“O que já deve estar acontecendo? Varejistas quebrando. O pequeno e médio varejista sem o fluxo de consumidor e de cliente no shopping acaba falindo. A quantidade de empresas que some do mapa durante a crise é muito grande. E a Renner, por exemplo, aguenta o tranco. Ela tem caixa líquido, é gigantesca, tem acesso a capital e o crédito para ela é farto. Ela fica viva. O lucro líquido dela cai durante a crise e ela queima caixa. Mas quebra? Não”, destaca Bredda.
No dia 16 de setembro, a OCDE atualizou as suas projeções para a queda e retomada do PIB mundial. As projeções atuais indicam que a queda do PIB mundial deve ficar em torno de 4.5% em 2020 com crescimento projetado de 5% em 2021.
“Esses números são mais otimistas em comparação aos lançados em meados de junho e sinalizam que a retomada, principalmente nos Estados Unidos e na China, foi melhor que a inicialmente esperada. No Brasil, os números são um pouco piores que os mundiais (queda esperada de 6.5% em 2020, com crescimento de 3.6% em 2021), mas são melhores que as previsões iniciais do primeiro semestre de 2020”, analisa Henrique Martins, especialista em finanças do IAG – Escola de Negócios da PUC Rio.
“No entanto, no caso das pequenas empresas brasileiras, a retomada, provavelmente, levará um pouco mais de tempo. Afinal, a recriação dos empregos perdidos não deverá acontecer na mesma velocidade de suas perdas. Para que essa retomada seja acelerada, parece ser necessário que viabilizemos estratégias de retomada da confiança do pequeno empresário, para que voltem a contratar funcionários, expandir negócios etc.”, acrescenta Henrique.
Pelo menos o pior já passou
Se seu negócio sobreviveu até aqui, um alento: os analistas são quase unânimes na tese de que o pior já passou. Não quer dizer que a vida será fácil daqui para a frente. Mas ver clientes chegando novamente é animador.
“Estamos na segunda quinzena de setembro de 2020 e as pessoas, majoritariamente, as que pertencem às classes A e B, já estão novamente executando atividades cotidianas como ir a shoppings, praia, bares e restaurantes. Naturalmente, essa retomada parcial dos setores de lazer e serviços não é suficiente para a completa retomada econômica. No entanto é um indicador de que, talvez, o pior já tenha passado”, comenta Henrique.
Papel da tecnologia no “novo normal”
Fábio de Paula, coordenador do MAGIS – Núcleo de Inovação do IAG – Escola de Negócios da PUC-Rio destaca que apesar da tecnologia ter nos auxiliado nesse momento de distanciamento social, ela não substituirá a interação humana.
“A realidade atual que é chamada de ‘novo normal’ certamente influenciará as nossas vidas após a pandemia. A virtualização de muitas atividades, que vinha sendo implantada em passos lentos anteriormente, fará parte do nosso futuro. Mas não creio que substituirá totalmente a interação humana. Acredito que o futuro será híbrido. Ao invés de aulas completamente virtuais, estas serão em parte presenciais e em parte à distância. Os escritórios não serão abandonados para dar lugar ao home-office, mas as pessoas poderão fazer várias de suas atividades e trabalhar parte da semana de suas casas. Atendimentos médicos preliminares virtuais complementarão diagnósticos possíveis somente através do exame físico. A virtualização veio para ficar. Porém, não substituirá a interação social e o contato físico que nos faz seres humanos”, analisa.
Já para Eliane Leite, coordenadora do MBA em Recursos Humanos do IAG – Escola de Negócios da PUC-Rio, a retomada vai envolver muitas mudanças para o setor. “As incertezas permanecem, e nesse ‘oceano de perguntas e dúvidas’, as organizações estão ‘resetando’ seus negócios, liderando de forma bem arquitetada as questões que consideram prioritárias para emergir mais fortalecidas e capazes de superar prováveis momentos críticos. E isso não significa considerar a retomada uma mera ‘volta aos escritórios’. As ações que visam a segurança e saúde das pessoas, assim como a infraestrutura tecnológica, são itens básicos e essenciais na agenda do RH. A Cultura Organizacional será um ponto vital a ser considerado. O que já mudou e o que ainda vai mudar? Qual a liderança que será aderente a essa nova cultura? Como vamos preparar os líderes?”, destaca a especialista.