Um debate tende a ser um momento em que os nervos estão à flor da pele e que, por diversas vezes, acaba culminando em ofensas e inimizades. No entanto, um debate também pode ser uma oportunidade de adquirir conhecimento, através do diálogo e da argumentação de maneira civilizada e organizada.
Por isso, é importante analisar os melhores momentos para debater; não existe necessidade de participar de um debate infrutífero. Para se ter ideia, uma pesquisa deste ano do BTG indicou que 53% dos eleitores acreditam que não faz diferença se um candidato comparece ou não aos debates eleitorais.
Esse número é fruto de uma crescente descrença no poder dos debates. Num mundo ideal, nós conseguimos dialogar com pessoas de sentimentos e ideias dos mais diversos. Seria possível abrir campos de discussão com qualquer um, sem treta, sem xingamento, sem falácia, sem se sentir ameaçada. O problema é que a realidade é muito mais complicada, e há brigas que não cabem a nós – porque estabelecer limites é essencial para ousar argumentar.
Erros gerados por falhas na comunicação percorrem a história, mostrando a atemporalidade da importância de uma boa forma de se comunicar. Conta-se que Cassandra, filha de Príamo, o rei de Troia, após um desentendimento com o deus Apolo, foi amaldiçoada: ninguém nunca mais iria entender o que ela dizia, sendo condenada a ser vista como louca.
Por isso, quando ela passou a avisar ao seu pai e irmão, Heitor, que Troia estava condenada à destruição, ninguém deu ouvidos – porque ninguém a entendeu. Muitas vezes, no processo de comunicação, nos sentimos verdadeiras Cassandras. Até sabemos usar a nossa voz, mas falamos A e o povo entende B.
Quando não debater
Em meio a tamanha crise do diálogo, entender os momentos certos de entrar em debates é essencial. Embora seja importante ter sua voz ouvida, em um mundo cada vez mais polarizado é importante saber “comprar as brigas certas”. Nem sempre a gente tem uma opinião formada sobre um assunto, porque nem sempre sabemos sobre o que está sendo discutido. Eu sei muitas coisas, mas principalmente sei que não sei tantas outras.
Por isso, é importante compreender que não podemos saber de tudo e reconhecer as próprias vulnerabilidades. Essa dificuldade é resultado da vulnerabilidade – uma palavra da moda, hype nos documentários da Netflix, em palestras corporativas, em livros best-seller. É tão lindo ler que é “preciso transformar vulnerabilidade em potência”. Tão lindo quanto difícil de pôr em prática.
Existem, também, pessoas com quem não se deve debater. Os debates devem ter o objetivo de adquirir conhecimento ou chegar a alguma conclusão; um debate sem propósito essencialmente não tem utilidade, com quem não estiver disposto a escutar. A argumentação não é um jogo de comparação.
Relações são uma profunda exploração e expressão de nós mesmos, e um convite para que outros possam fazer o mesmo conosco. Esperar que o outro viva, pense, experimente e seja da mesma maneira que nós ou de quem está no nosso entorno imediato é desastroso, porque não dá espaço para que os outros se mostrem, se revelem, surpreendam e nos toquem.
Para isso, é importante identificar os diferentes tipos de perfis em um debate. Adam Grant separou os debatedores em 5 categorias:
- o cientista, que é considerado o melhor estilo de debatedor, parte do princípio de que pode estar errado e busca conhecimento com o debate;
- o pensador crítico, que procura os diferentes pontos de vista em um tema, depois disso cria sua opinião;
- o “do contra”, que sempre procura falhas e brechas na argumentação do outro;
- o político, que apoia incondicionalmente sua visão e ataca os demais que discordam;
- por fim, temos o líder de culto, que acredita na verdade absoluta de seu lado, apelando algumas vezes para o divino.
Como evitar a ansiedade
É comum sentir ansiedade antes de um debate, mas existem algumas técnicas para manter a calma antes de uma discussão importante. Ter o acompanhamento de um fonoaudiólogo ajuda a articular seus pensamentos e poder ser ouvido.
A postura também tem grande impacto, não apenas estético, uma vez que uma boa postura pode facilitar a clareza da voz. Trabalhar a respiração também é importante: além de também impulsionar a voz, a respiração é um bom meio de acalmar a ansiedade para um bom debate.
Por fim, deve-se entender que a comunicação é um diálogo, que sempre ocorre entre pelo menos dois agentes, logo é fundamental entender que vai haver discordâncias. A comunicação nunca é 100% clara, óbvia e transparente.
A comunicação é, antes de mais nada, uma expectativa. Mesmo quando conseguimos nos fazer entender, sempre tem alguma coisinha que não é exatamente bem compreendida. A boa notícia é que esses ruídos são oportunidades de aprendizado.
* Maytê Carvalho é escritora, professora, comunicóloga e autora do livro Ouse Argumentar: Comunicação assertiva para sua voz ser ouvida.
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