Análise e gestão de risco não é bola de cristal, mas funciona
Ter a disposição ferramentas que possam auxiliar na análise e gestão de riscos, independente do segmento, é imprescindível em processos onde o tempo é precioso
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) criaram o Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade, Grande Impacto e Repercussão. A medida foi necessária em razão da recorrência de catástrofes nos últimos tempos no Brasil. Sua proposta é tornar mais ágil as medidas a serem tomadas, em âmbito judicial ou extrajudicial, para dar assistência às vítimas de catástrofes. Também serve para trazer à tona a necessidade que tanto organizações públicas quanto o segmento corporativo avaliem sua gestão de risco, para responderem com efetividade mediante o menor indício de ameaça.
No geral, as adversidades que culminam em catástrofes, ou ocorrências que possam colocar regiões, cidades, organizações, populações em colapso, costumam ser o resultado de um conjunto de múltiplas falhas. Uma vez concatenadas, levam a cenários indesejados que infelizmente são pouco considerados em análises de risco tanto quantitativo como qualitativo. Se uma determinada sequência de eventos (ou ocorrências) são iniciados e levam a um cenário catastrófico, a avaliação do risco e seu impacto pode se mostrar particularmente difícil. Devido a baixa probabilidade estatística, estes cenários podem ser descartados por parecerem improváveis. Contudo, os dados podem gerar resultados inesperados.
Especialistas traçam cinco visões de risco, como é o caso de Ernest J. Henley e Hiromitsu Kumamoto, autores de publicações relacionadas a análise e gestão probabilística de risco para engenharia e ciência. Em “Probabilistic Risk Assessment and Management for Engineers and Scientists”, eles destacam que o risco é determinado a partir de um conjunto de fatores: a probabilidade de o acontecimento ocorrer, o acontecimento em si, a significância em torno do acontecimento, o cenário casual e a população afetada pelo acontecimento. O que pode ocorrer em nível individual, em uma companhia, no setor público e na sociedade.
Compreender inteligência suportada por tecnologia
A gestão e análise de risco pode ter como principal aliada a tecnologia. Com as ferramentas adequadas, coletando dados de múltiplas fontes e a partir de cenários previamente desenhados (para os perfis de risco e suas ocorrências conhecidas), os gestores podem somar o fator humano com soluções tecnológicas. É possível antecipar ações, identificar gatilhos que iniciem cenários indesejados, ou mesmo durante uma ocorrência responder rapidamente com o devido plano de mitigação para evitar o pior. Mas, no geral, o que se tem visto é uma onda de negligências quando da ocorrência de falhas. E isso não diz respeito apenas a área pública, mas também a corporativa. É necessário, portanto, investimento em análise de risco, assim como o uso de tecnologias para prevenir e mitigar riscos.
Há softwares que utilizam doutrina praticada no ambiente militar, por exemplo, para suportar o comando e controle na prevenção, análise e ação quando em crise, medida conhecida como consciência situacional. Nesse caso, a função da ferramenta é coletar vários dados, originados através de sensores, câmeras, internet, informações disponíveis em repositórios públicos abertos e, inclusive, indicadores de sistemas especialistas da própria organização. Normalmente estão em silos, sem qualquer interface com outros sistemas. Dessa forma, é possível avaliar os indicadores em tempo real para, então, tomar medidas delineadas para cada perfil de risco associado, mapear a gestão do risco e acompanhar a evolução do(s) plano(s) de ação. Isso deve incluir recursos diversos, como maquinário, pessoal especializado, coordenação de comunicação com defesa civil, segurança pública e outros, para mitigar eventuais resultados catastróficos. Com as ferramentas adequadas, o fator humano consegue prever e até antecipar ações para evitar diversos problemas. Quando o risco é conhecido, pode ser calculado e, a partir dele, planejar medidas. Especialmente quando há vidas em jogo.
No caso de gestões públicas, ferramentas de comando e controle auxiliam no monitoramento em tempo real da condição atual. Permitem a identificação de eventuais gatilhos de possíveis cenários e a compreensão de impactos e resultados que podem acontecer no futuro, seja próximo ou não. Associadas a recursos como Internet das Coisas e Inteligência Artificial, e através do desenvolvimento de aplicativos para celulares, é possível deixar a sociedade a par do que está acontecendo. Esse mesmo tipo de medida também é importante no caso de organizações privadas, a fim de planejar seus investimentos, ter conhecimento de possíveis cenários, mesmo que incertos, para evitar perdas ao negócio.
Há pouco tempo, o Brasil presenciou mais uma catástrofe, desta vez ocorrida em Brumadinho, Minas Gerais. Pouco mais de três anos após o rompimento da barragem em Mariana, no mesmo estado, a sociedade se depara com mais uma situação envolvendo perdas irreparáveis, sobretudo para às famílias das vítimas cujas vidas foram ceifadas. Juristas e especialistas avaliam que o colapso poderia ter sido evitado. A empresa envolvida, inclusive, já tinha acesso a estudos sobre possibilidades de risco, que foram negligenciados. A partir do último episódio, governos já estão se mobilizando para monitorar outras barragens em diversas regiões brasileiras.
Nesse cenário, ter a disposição ferramentas que possam auxiliar na análise e gestão de riscos, independente do segmento, é imprescindível em processos onde o tempo é precioso, assim como os recursos envolvidos. Na falta de uma bola de cristal para prever o amanhã, é possível usar o conhecimento associado à tecnologia para se antecipar e evitar finais tristes.
Gustavo Jota — Gerente de Marketing de Produto na Dígitro Tecnologia.