Esta é uma pergunta que venho recebendo nos últimos anos. Eu sou assistente social, pós-graduada em psicologia organizacional, educação para relações étnico-raciais, direitos humanos e mestre em serviço social. Sempre estudei e atuei sobre as questões sociais e suas expressões. A minha trajetória profissional, em maior parte em empresas, foi atuando com o bem-estar e qualidade de vida de pessoas no ambiente de trabalho e nas relações das empresas com os territórios e comunidades ao entorno.
Portanto, atuo com diversidade, equidade e inclusão, a chamada DE&I, mesmo antes de existir a nomenclatura que usamos atualmente. No decorrer da minha trajetória profissional, nunca parei de estudar, sempre me aprofundando e buscando formações de qualidade sobre as questões sociais, mas também sobre o funcionamentos das organizações.
Assim como a filósofa Sueli Carneiro, também me identifico como uma intelectual orgânica. Sou fruto do meu meio social, das minhas vivências e dos movimentos sociais. Sou uma mulher preta periférica, que teve em casa referências de mulheres pretas de luta. Minha mãe, sem acesso à formação acadêmica, sempre foi uma mulher atuante para mudanças sociais e coletivas. Minha casa já foi centro comunitário, sede de oficinas de geração de renda para mulheres, ponto de apoio a famílias em situações de vulnerabilidade e tantas outras coisas. Isso é sobre os saberes construídos nas lutas por emancipação.
Sou neta da dona Odete, filha da dona Valquiria e também fruto de movimentos negros educadores, como a Educafro e a Uneafro. Como diz a pedagoga Nilma Lino Gomes, sou letrada racialmente pelos movimentos negros educadores e pelos saberes construídos na vivência e na luta coletivas. Eu não sou consultora de diversidade só porque sou uma mulher negra, mas pela minha trajetória de vida, pela minha formação acadêmica e profissional.
Não podemos romantizar esse trabalho/essa área. É muito bom unir sua profissão – projeto ético-político – e seu propósito de vida. Atuar na área de diversidade, equidade e inclusão não é um mar de rosas. Temos muitos desafios e resistências. Lidamos diariamente com dores e feridas estruturais. Para ser um profissional de DE&I é necessário muito mais do que paixão, é necessário muitos conhecimentos (hard e soft skills), estratégia, formação, experiência e vivências.
Todos os dias me comprometo a não esquecer que a luta é coletiva e que a ascensão individual não significa mudança social coletiva. Não quero me desconectar de onde eu vim, de quem eu sou e, cada vez mais, quero me conectar com um futuro possível para todas as pessoas pretas.
“Enquanto a terra não for livre, eu também não sou” (Emicida, Principia)
Termino esta reflexão com Guy Debord, criador do conceito de “sociedade do espetáculo”, que nos provoca sobre o poder que as imagens exercem na sociedade contemporânea. O autor definiu o espetáculo como o conjunto das relações sociais mediadas pelas imagens. Em 1988, ele afirmou que a produção de espetáculos tomou conta de toda a vida social e que o poder espetacular manifesta-se agora de forma integrada, já que desapareceram os movimentos sociais de oposição, que se assimilaram à sociedade capitalista e não defendem mais sua superação. É importante lembrar que temos um longo histórico de falsos heróis. Então precisamos de mais referências e menos ídolos.
“Toda a vida contemporânea é mediada pelo espetáculo. Tudo se dá à vista, o pensamento é dispensável, ser visto, não” (Guy Debord)
Estamos vivendo a lógica da sociedade contemporânea, um cenário de espetacularização de vários aspectos da nossa vida, que não é diferente na vida profissional, inclusive no Linkedin. Passamos do SER para o TER, e agora estamos vivendo a época do PARECER. Cuidado, não se engane, muitas vezes estamos nos relacionando com imagens, somente com o que mostram para a gente e como querem que vejamos. É preciso estar atento!
* Verônica Vassalo é consultora de DE&I na Tree Diversidade.